PF investiga fraude bilionária no INSS envolvendo associações de fachada, propina e servidores

30/04/2025

Por Revista Formosa

Uma investigação da Polícia Federal (PF), em conjunto com a Controladoria-Geral da União (CGU), revelou um esquema de fraudes e desvios em aposentadorias e pensões do INSS, que pode ter causado prejuízo de até R$ 6,3 bilhões.

Segundo os investigadores, associações que se apresentavam como prestadoras de serviços a aposentados realizavam filiações fraudulentas, com assinaturas falsificadas, para aplicar descontos indevidos diretamente na folha de pagamento dos beneficiários do INSS. Em troca, servidores públicos recebiam propina para facilitar o acesso a dados e autorizar os débitos.

Estrutura do esquema

O modelo de fraude envolvia:

  • Pagamento de propina a servidores do INSS;

  • Uso de associações de fachada, presididas por laranjas;

  • Inserção de descontos sem autorização dos beneficiários;

  • Falsificação de assinaturas em fichas de filiação.

Duas dessas associações funcionaram no mesmo endereço em Fortaleza (CE) por mais de quatro anos, sob liderança da mesma dirigente, Cecília Rodrigues Mota, que realizou 33 viagens em menos de um ano — algumas ao exterior, como para Dubai, Paris e Lisboa.

Modus operandi

As entidades cadastravam beneficiários sem consentimento, utilizando dados obtidos ilegalmente. Descontos em folha eram liberados "em lote", sem validação individual, o que ampliou rapidamente a escala das fraudes. Há registros de beneficiários filiados a mais de uma entidade no mesmo dia, com erros idênticos nas fichas — sinal claro de fraude sistematizada.

Envolvidos

Até o momento, 11 entidades foram identificadas como participantes do esquema. Seis pessoas ligadas a entidades de Sergipe foram presas. Além disso, seis servidores do INSS foram afastados por decisão judicial:

  • Alessandro Stefanutto (presidente do INSS, demitido);

  • Virgílio A. R. de Oliveira Filho (procurador-geral);

  • Giovani B. F. Spiecker (coordenador de atendimento);

  • Vanderlei B. dos Santos (diretor de benefícios);

  • Jacimar F. da Silva (coordenador de pagamentos);

  • Philipe Coutinho (policial federal, apoiador do grupo).

O lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, apelidado "Careca do INSS", é apontado como articulador central. Ele movimentou R$ 24,5 milhões em cinco meses e é procurador em diversas associações. Parte dos valores desviados teria sido repassada a familiares de dirigentes do INSS e a ex-integrantes do governo anterior.

Escala e impacto

Segundo a CGU, entre janeiro e junho de 2024, foram registrados mais de 742 mil pedidos de cancelamento de descontos indevidos. Em 95,6% dos casos, os beneficiários alegaram não ter autorizado a filiação. As 11 associações investigadas somam 6,5 milhões de beneficiários com descontos ativos — número que ainda está sob auditoria.

Os valores cobrados aumentaram significativamente:

  • 1º semestre de 2023: R$ 639 milhões

  • 2º semestre de 2023: R$ 1 bilhão

  • 1º semestre de 2024: R$ 1,63 bilhão

O pico está relacionado à liberação de descontos sem a adoção das tecnologias de segurança previstas.

Cidades mais afetadas

As fraudes se concentraram no Nordeste, especialmente no Maranhão e Piauí. Em 19 municípios, mais de 60% dos beneficiários tiveram descontos indevidos. A CGU identificou filiações de idosos residentes a centenas de quilômetros da sede das entidades.

Bens apreendidos

Na operação "Sem Desconto", deflagrada em 23 de abril, a PF apreendeu:

  • R$ 1,7 milhão em espécie;

  • 61 veículos de luxo (avaliados em R$ 34,5 milhões);

  • 141 joias;

  • Diversas obras de arte.

Omissão e conivência do INSS

Apesar de alertas da CGU entre maio e julho de 2024, o INSS ignorou seis notificações e autorizou, de forma excepcional, novos descontos com base em sistemas não validados pela Dataprev. A PF identificou que sete novos acordos foram assinados em 2024, mesmo com auditorias em andamento.

A instrução normativa 162, de março de 2024, determinava o uso de biometria e assinatura eletrônica para novos descontos. Contudo, a direção do INSS criou regras "transitórias" que permitiram a retomada dos débitos em junho, contrariando parecer técnico da Dataprev.

Posição do governo

O governo Lula suspendeu todos os descontos associativos e prometeu ressarcir os valores. O ministro Carlos Lupi reconheceu a demora nas ações, mas negou omissão. Alessandro Stefanutto foi demitido no dia da operação — o segundo presidente do INSS exonerado sob esta gestão.

Defesa de Stefanutto

Em nota, a defesa de Stefanutto afirma que ele:

  • Adotou medidas para coibir fraudes, como exigência de biometria;

  • Criou canal para exclusão automática de descontos;

  • Solicitou auditorias internas e informações à PF;

  • Não há provas de dolo em sua conduta.

Entre janeiro de 2023 e março de 2025, mais de 3,5 milhões de descontos foram cancelados por usuários — número significativamente maior que os 121 mil cancelamentos registrados em 2022.

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